“Nas Nuvens” Com Os Pés No Chão.

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Antes de mais, “Up In The Air“, terceira longa-metragem de Jason Reitman (segunda como argumentista), é o melhor filme estreado este ano em Portugal. Sim, eu sei que não quer dizer muito, o ano vai no inicio, mas tenho a certeza que, daqui a onze meses, esta afirmação não estará tão longe da verdade. Com “Obrigado Por Fumar” e “Juno“, Reitman já demonstrara ser um excelente contador de estórias simples, realistas e  repletas de substância.  Numa altura em que a forma se sobrepõe ao conteúdo em prol de uma melhor bilheteira, “Up In The Air” é uma película virada para o interior, para o individuo e para a sua relação com os outros e ao seu lugar na sociedade. não de forma implícita, mas em que todo o filme gira à volta disso mesmo. E só isso não é pouco.

Ryan Bingham (George Clooney) é um homem que viaja pelos Estados Unidos a despedir empregados que os patrões não tem coragem de despedir e  a dar conferências sobre aquilo que nos complica a vida: a nossa dependência às pessoas e às coisas. Os aeroportos e aviões são a sua casa, e essa realidade é confortável e necessária à sua independência emocional e à sua máxima de que parar é morrer. Conhece Alex (Vera Farmiga), uma sensual, madura e independente mulher com quem tem uma relação confortavelmente dependente de compromissos profissionais e horários de escalas e voos. Quando o seu patrão contrata Natalie (Anna Kendrick) para optimizar a empresa, implementando um sistema de despedimento por vídeo-conferência que vai tornar as suas viagens inúteis, Ryan leva Natalie numa última viagem, para lhes provar que estão errados e tentar manter o seu modo de vida.

Apesar de não ser sempre perfeito (no fim a coisa fica um pouco piegas), “Nas Nuvens” tem uma honesta e absorvente estória, que agarra o espectador pela simplicidade da aproximação aos personagens e à forma como força uma identificação com o protagonista (que desde o inicio nos explica, em voz off, as suas motivações e atitudes). Esse é o ponto forte do filme, tal como o era nos anteriores: As personagens principais são humanos: Erram, são egoístas, egocêntricos e… adoráveis. E essa dualidade é aquilo que prende o espectador ao desenrolar do enredo, fá-los importar-se.

Claro que para essa identificação, o elenco é importantíssimo. Clooney é brilhante na contenção e na aparente serenidade emocional, que pode desmoronar a qualquer momento. Farmiga é irrepreensível na sensualidade e falso à-vontade que coloca na sua personagem. Kendricks é a jovem vulnerável que tenta em vão projectar a imagem de que é forte. Do resto do elenco destacam-se Jason Bateman, o patrão de Ryan, J.K. Simmons e Zach Galifianakis, como dois dos desesperados despedidos. Mas um dos pontos fracos do filme é todo o restante elenco. Principalmente nas sequências em que várias pessoas são sequencialmente despedidas, a maioria das reacções soam a falso e corta-se aí um pouco da relação do espectador com a estória. Num filme tão simples e realista, é uma acidental e danosa chamada de atenção para a teatralidade.

No geral, “Up In The Air” é um filme muito bem estruturado (o guião segue todas as regras académicas sem as tornar banais ou chatas), com excelentes fotografia, banda sonora e montagem. A realização de Reitman contribui para fortalecer o seu lugar na indústria como um competente autor, que apesar de centrar o seu olhar na vida de todos nós, o faz de forma sóbria elegante e elaboradamente simples. O seu academismo (no bom sentido, e não naquele que é vulgarmente atribuído a Ron Howard, por exemplo) aproxima-o do espectador, principalmente daquele que nos últimos tempos se tem distanciado do cinema. Se o futuro do cinema passa por “Avatar”, passa também obrigatoriamente por “Nas Nuvens”, um filme que tem os pés bem assentes no chão.

Classificação: 4/5

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