10 Anos / 20 Escolhas #3 – 2011.

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O 3º convidado a revisitar connosco os 10 anos do laxanteCULTURAL é o Carlos Martins do Um Dia Fui Ao Cinema. O Carlos é outro dos bloguers que conheci no Fantas de 2010, e temos a sorte (ou não) de fazer parte da mesma faixa etária. Partilhamos inúmeras referências e, há precisamente um mês, estávamos a conviver pelo 10º ano consecutivo no festival. É o mais eclético e regular bloguer que conheço, publicando um artigo por dia desde que o sigo. Se alguma vez falhou, eu não notei. Acima de tudo, é um gajo porreiro e é um prazer contar com ele nesta iniciativa. Obrigado, Carlos.

A escolha do Carlos Martins – “Rise of the Planet of the Apes” de Rupert Wyatt.

Rise of the Planet of the Apes - banner

O laxanteCULTURAL está a celebrar o seu 10º aniversário (parabéns!) e desafiou-me a escolher e falar sobre um filme dos últimos 10 anos. Uma tarefa que não é tão fácil quanto possa parecer, já que os filmes que mais depressa me surgem na memória não são da década passada mas sim – literalmente – do século passado! Dito isto, lá me coube a missão de recuar até ao ano de 2011 e escolher um filme.

Rise of the Planet of the Apes 01

Depois de diversas indecisões (poderia falar do regresso de “Tron: Legacy“, do claustrofóbico “Sanctum“, do colorido “Sucker Punch” ou do atmosférico “Monsters“), a escolha acabou por recair sobre o “Rise of the Planet of the Apes“.

Porquê este “Rise of the Planet of the Apes”? Bem… não será seguramente um filme que possa considerar como sendo “de referência”, mas acaba por ser escolhido precisamente pela associação que permanece às distantes memórias do passado, mais concretamente ao filme “Planet of the Apes” original. Não me recordo exactamente quando é que vi o filme pela primeira vez, mas sei que mesmo antes de ter consciência de o ver, já me tinham ficado permanentemente gravadas na memória as imagens da sequência inicial do filme (spoilers ahead!) de quando a nave se despenha no planeta e se começa a afundar, com uma das câmaras de animação suspensa a ter ficado avariada, com o astronauta “mumificado”. Só muito mais tarde, ao rever o filme com mais alguns anos de idade, é que finalmente descobri: ah, afinal era este o filme!

 Rise of the Planet of the Apes 03

O filme “Planet of the Apes” deu origem a uma verdadeira saga, contando com múltiplos filmes – “Planet of the Apes” (1968),  “Beneath the Planet of the Apes” (1970), “Escape from the Planet of the Apes” (1971), “Conquest of the Planet of the Apes” (1972) e “Battle for the Planet of the Apes” (1973) – e até uma série de televisão. Um fascínio que depois acalmou, até se ter tentado recuperá-lo com um remake feito em 2001 por Tim Burton (sem os resultados esperados) e, uma década mais tarde, com este “Rise of the Planet of the Apes” em versão prequela, coisa que aliás já tinha sido abordada no “Conquest of the Planet of the Apes”. O seu maior trunfo será funcionar como uma forma de apresentar este fascinante mundo, repleto de analogias sociais e raciais, a toda uma nova geração que à partida nunca iria ter curiosidade de espreitar uma série de filmes da década de 60 e 70. E, por isso mesmo, penso que se justifica plenamente o destaque, mesmo que de certa forma se possa considerar uma reciclagem de coisas já feitas.

A minha escolha – “Sangue Do Meu Sangue” de João Canijo.

Sangue Do Meu Sangue - Poster

Ao olhar para o meu top do ano de 2011, tive a certeza imediata que iria escolher “Drive“, de Nicolas Winding Refn, por 3 razões: foi o meu número 1 desse top, não escrevi sobre ele na altura e são dele, desde então, as imagens que os recebem à entrada neste espaço. Mas depois olhei para o calendário de estreias do ICA para esse ano, e saltou-me à vista um filme que, tivesse-o visto em tempo útil, reclamaria para si o 1º lugar e as suas imagens decorariam agora este blog. Trata-se do arrebatador “Sangue Do Meu Sangue” de João Canijo.

Sangue Do Meu Sangue 01

Lembro-me de, aquando da estreia nos cinemas, a RTP ter passado o excelente documentário “Trabalho de Actriz, Trabalho de Actor“, sobre o processo de criação do guião pelos actores em conjunto com o realizador, baseado na improvisação e suas experiencias pessoais. Esse trabalho de concepção resulta em personagens complexos, com uma naturalidade desarmante. Apesar de ter visto o documentário muito antes de ter visto o filme (só o vi quando foi editado em DVD), nada me poderia ter preparado para experiência de o ver, e a experiência não ficou estragada, pelo contrário.

Sangue Do Meu Sangue 02

E é fácil de explicar o porquê. Não me lembro de ter visto até então, e mesmo depois, uma experiência tão submersiva, tão intensa e hipnozante quanto esta. O trabalho de som e imagem é tão rigoroso e envolvente, que me prendeu do primeiro ao último segundo. A forma como Canijo deixa os actores à solta e nos dirige a nós espectadores, por esta narrativa subtil e familiar, aguçando-nos os sentidos com informações diferentes, misturando cenas e diálogos, alternando-os e sobrepondo-os, é extremamente eficaz e cativante. Há uma comovedora confiança na capacidade de trabalho e concentração dos actores, que permite exponenciar atmosféricamente os exíguos décors. A banalidade do dia-a-dia torna-se na mais interessante da narrativas, da qual passamos a fazer parte desde o primeiro momento. E é estranha essa proximidade que se vai entranhando, quase como se tivéssemos participado daqueles ensaios onde personagens e dinâmicas foram criadas.

Sangue Do Meu Sangue 03

E depois, os actores. A lista de excelência é longa, e é injusto nomear apenas alguns. Mesmo assim, vou sê-lo e nomear o Nuno Lopes e a Anabela Moreira, pelos riscos que correram, e pela coragem que tiveram ao corrê-los. O Nuno, pela forma como se perde no Telmo e nos força a odiá-lo, a Anabela pela forma como se anula perante a Ivete e se expõe perante nós. E são absolutamente desarmantes, todos.

Talvez seja demasiado tarde para enaltecer este magnífico filme, e dessa vergonha já não me safo, mas há neste texto um sentido de justiça que me tranquiliza.

Classificação: 5/5

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