Foi ontem à noite a Gala de Abertura do Fantasporto , edição do 30º aniversário. E, se o inicio de mais uma edição do maior festival de cinema Português é uma alegria para os cinéfilos, o tom sombrio dos discursos feitos e as negras previsões para o futuro do festival, deixaram um sabor amargo na boca e um aperto na caixa torácica de todos os que marcaram presença no grande auditório do Rivoli Teatro Municipal (que, não fosse o Fantasporto, já teria mudado de designação para Teatro La Féria ou Politeama II). E nem o discurso (aparentemente) empolgado da Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, trouxe alguma tranquilidade em relação a esse mesmo futuro. A alternativa da realização de futuras edições do festival no futuro Pólo do Porto da Cinemateca Portuguesa (a ser criado na escassa lotação da Casa das Artes), não resolve o problema, apenas o intensifica, tal é importante o aumento de público para a sobrevivência do certame. É para mim estranho que o Ministério da Cultura se coloque de fora de uma questão essencial para o Festival, mas sobretudo para a cidade do Porto: A restituição daquele equipamento à cidade, aos seus artistas e autores que costumavam ali ter oportunidade de expôr a sua arte e dinamizar a cultura da Cidade, com novas propostas, novas tendências e mais diversidade. Não tenho nada contra LaFéria (não aprecio, mas defendo que deve haver no Porto oferta para todos os gostos), mas sim contra a politica cultural de Rui Rio (que obviamente não compareceu na gala, talvez por não haver corridas de carros ou aviões, apenas cultura), ou quase inexistência da mesma. É que mesmo a alternativa mais viável, o teatro Sá da Bandeira, está com os dias contados. O Rivoli, de espaço multi-cultural (Cinema, Teatro, Exposições, concertos), passou a expositor monótono da megalomania de um único autor. O facto das alternativas serem muito mais caras para o espectador (os concertos que passaram a acontecer na Casa da Música são um exemplo claríssimo disso), fará com que, a longo prazo, o Porto deixe de saber o que é a cultura. Mas, peço desculpa pela divagação, voltemos ao festival e à gala.
Foram os discursos da praxe pelos directores do festival, Beatriz Pacheco Pereira e Mário Dorminsky, de boas vindas ao público, de divulgação do que por lá passou e vai ainda passar, de receios e desejos para o futuro e, principalmente, do alerta de que a sobrevivência do festival depende também muito da comparência de público nesta edição. E o que lá foi ontem ( e que lotou o grande auditório) assistiu a momentos divertidos, pela entrada em palco de alguns dos robôs que tem estado no Rivoli, inseridos na retrospectiva Cinema e Robótica. Por lá pode mesmo ver-se o robô mais avançado do mundo actualmente. Está no átrio do Rivoli e interage com quem por lá passar. Foram entregues prémios (foi estranho ouvir este termo no primeiro dia do festival, talvez devessem ter optado por outro) aos cientistas participantes nesta área e também a Samuel Hadida e Michael J. Bassett, produtor e realizador do filme de abertura, “Solomon Kane“. Foi uma gala simpática, apesar de ensombrada pela imprevisibilidade do futuro do festival.
Reforço aqui o apelo para que, se forem apreciadores de cinema, do festival ou meros apoiantes da causa, façam um esforço para comparecer até dia 7 no Rivoli. Além de que seria agradável ver sempre o auditório como estava ontem, o Festival e a Cultura no Porto precisam de todo o apoio possível.
Quanto ao filme de abertura, “Solomon Kane”: Não é um bom filme, longe disso, mas é um filme que se enquadra muito bem naquele que foi sempre o espírito do Fantas. É um filme do género fantástico, de baixo orçamento, com um tom de certa forma naíve, mas esforçado e feito por declarados fãs do género. Passado na idade média, conta a estória de um homem que procura a redenção. Depois de ter sido um agente do diabo, matando todos os que se cruzavam consigo, motivado pelo ódio, ganância e sede de poder, vira-se para a fé ingressando num mosteiro, quando um emissário do diabo vem reclamar a sua alma. Com um passado trágico e doloroso, vai voltar a matar, quando a família que o ajuda quando é forçado a deixar o mosteiro, é massacrada e a filha do casal é aprisionado pelos agentes do mal. Nessa cruzada vai também reencontrar velhos fantasmas e emendar erros do passado.
Criado por Robert E. Howard, o mesmo de “Conan” e “Red Sonja“, contém todos os elementos destes títulos, além de parecer ter sido feito na mesma altura. Nota-se um tom forçado e mesmo pretensioso na tentativa de tornar um mero filme de aventuras, no género sobrenatural, numa luta moral entre o bem e o mal. Com James Purefoy (“Rome“, “Resident Evil“) no personagem que dá título ao filme, conta ainda com as interpretações dos excelentes Pete Postlethwaite e Max von Sydow em pequenos papéis. Os efeitos especiais cumprem o objectivo e, apesar de não serem nada de novo, são o melhor do filme. O realizar Michael J. Bassett (repetente no Fantas), além de uma paixão pelo género, demonstra ainda inexperiência e uma falta de controlo de todos os elementos que compõem uma fita deste género, apesar de conseguir algumas imagens fortes e apelativas do ponto de vista cinematográfico. “Solomon Kane” é por isso um filme desconexo, desequilibrado e inconsequente, mas que se enquadra perfeitamente no espírito do festival, conseguindo mesmo arrancar uma calorosa salva de palmas ao público.
Classificação: 2/5
Para hoje, escolhi ver “La Horde“, filme de zombies Francês e “Thirst“, filme coreano de vampiros já premiado em Cannes, realizado por Chan-Wook Park (“Oldboy” e “Sympathy For Lady Vengeance“). Espero ver-vos a apoiar o Fantas no Rivoli. Podem consultar o resto da programação aqui.